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sexta-feira, 15 de julho de 2011

Design Filosofia - vício e paixão

Filosofia do Design, parte XLIX – Vício, paixão e Design

 

*texto originalmente publicado no Design Simples.
O que há entre o vício e a paixão? Projeto. E se considerarmos Design enquanto projeto, corremos o risco de confundir paixão e vício. Quando projetamos alguma coisa, estamos apaixonados pela possibilidade de satisfazer determinada necessidade humana. Então o vício começa e se sustenta com essa paixão por uma satisfação que nunca é sanada por completo. A agonia, pois, faz parte da paixão e do vício. E o designer acaba supondo que pode solucionar tal agonia e, com isso, se livrar da culpa de um vício apaixonado pela satisfação.
Isso pode ser ilustrado com o mito da Torre de Babel. Parte-se de uma conspiração do povo babeliano que, indignados contra a infelicidade predominante neste mundo, resolveram construir uma torre gigante para acertarem as contas com Deus. Afinal, se Ele é perfeito e vive no céu/paraíso, por que Seus filhos têm uma vida tão precária e sem sentido? Tudo indicava que os babelianos eram vítimas de uma grande injustiça divina.


 


O povo então se uniu apaixonadamente para desenvolver o projeto da torre colossal. Porém, conforme descreve Pondé (2010), os jovens descobriram que seus pais e avós não conseguiriam subir tantos degraus até o paraíso. Logo, a promessa da eterna perfeição só pertencia aos jovens – a busca pela saúde e pela boa alimentação era a solução para velhas dúvidas existenciais. Evidentemente, um novo tipo de dúvida se instaurava: o que fazer quando alcançarmos a perfeição? “Mas remédios novos nos ajudaram a calar essa angústia mal-educada” (op. cit., p. 162).
No fim, quando a torre ficou pronta, todos subiram de uma só vez, feito viciados desesperados. Mas ao invés do paraíso, alcançaram o inferno: a torre ruiu e todos morreram. Este mito da pretensão humana de criar um paraíso com as próprias mãos também é retratado, em um contexto mais atual, no filme Requiem for a Dream (Daren Aronofsky, 2000). Em linhas gerais, os personagens são aprisionados, sob diferentes formas de vícios, à angústia existencial decorrente de um mundo ideal que nunca chega.
No entanto, ao contrário da maioria das críticas (como essa), não achei que o filme tenha sido uma crítica ao submundo do consumo de drogas e à alienação cotidiana. Em primeiro lugar, a palavra réquiem significa um tipo de prece ou missa composta para um funeral. Em sua origem latina, trata-se da expressão requiem aeternam dona eis, que significa “dai-lhes o repouso eterno”. Ou seja, o título do filme sugere uma espécie de homenagem ou luto aos sonhos que nunca morrem, isto é, nossas paixões eternas.


 

“Ao longo do filme, Aronofsky retrata-nos um percurso abismal destas quatro personagens que vão se autodestruindo até não terem mais nada além do vício” (Portal Cinema) – discordo. Os protagonistas de fato perdem tudo, exceto seus sonhos. Eles não são escravos do vício, mas antes são escravos de seus sonhos.
E é isso que nos torna humanos: projetar uma forma de alcançar nossos sonhos e paixões, ainda que essa busca seja também um vício.
O sonho de um paraíso babeliano nada mais é do que um vício humano por uma vida mais digna, saudável, privilegiada e feliz. Se os mitos são, nas palavras de Pondé (2010, p. 157), “narrativas ancestrais sobre maldições eternas”, acredito que o Design enquanto projeto é um mito movido pela culpa de uma paixão nunca saciada: os nossos sonhos e ideais. E assim como a comunicação em geral, de acordo com Flusser (2007), o Design surge graças à intenção de atribuir significado ao ser-para-a-morte, isto é, ao inevitável vício sem sentido que é viver.
Essa ideia do Design como sendo um mal-estar entre os vícios e paixões pode parecer romântica, mas na verdade contraria a crença (esta sim romântica) de que o designer deve sanar necessidades. Talvez seja esta a nossa intenção, mas não nossa finalidade. Trata-se de uma comédia divina, tal como sugeria Dante Alighieri, onde estamos viciados em uma paixão insaciável que, por sua vez, nos permite continuar sendo eternos sonhadores.
“Life is a waterfall, we’re one in the river and one again after the fall. Swimming through the void we hear the word, we lose ourselves but we find it all. Cause we are the ones that want to play, always want to go but you never want to stay. And we are the ones that want to choose, always want to play but you never want to lose” (Aerials, System of a Down).

quarta-feira, 30 de março de 2011

EMPREendeDESIGN

http://doislitros.blogspot.com/2011/03/empreendedorismo-aplicado-ao-design.html

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

Filosofia do Design, parte I – o sentido imagético

Filosofia do Design, parte I – o sentido imagético





postado por Marcos Beccari


Todos os homens têm, por natureza, desejo de conhecer: uma prova disso é o prazer das sensações, pois, fora até da sua utilidade, elas nos agradam por si mesmas e, mais que todas as outras, as visuais (ARISTÓTELES, 1979, p. 11). Essa inclinação natural do homem ao conhecimento imagético, a qual Aristóteles reconheceu há muito tempo atrás, configura em linhas gerais a real inspiração de meus estudos em Filosofia do Design.


Mais do que isso, defendo que existe uma espécie de anterioridade ao conhecimento humano – o que é este conhecimento capaz de questionar a si mesmo? Ou o que é o conhecimento do conhecimento? –, pois o ser humano não apenas conhece, mas sabe que conhece. Sabe de suas sensações e sentimentos; sabe especialmente de sua liberdade em imaginar, e isso me parece fazer parte da própria possibilidade de ser da nossa espécie. Mas o que é este sujeito capaz de imaginar e que tem conhecimento da sua própria imaginação? Como esclarecer essa nossa capacidade, enquanto designers, de imaginar o imaginado e até o não imaginado por outrem?


O conceito é irrepresentável, mas a imagem é inexplicável. Entre eles há portanto uma distância irreparável. E por isso a imagem vive da nostalgia do texto; e o texto, da nostalgia da imagem (BAUDRILLARD, 2002). A imagem reside em nossa mente, ou seja, trata-se de uma idealização. Já o texto é aquilo que se lê, sendo possível interpretá-lo, modificá-lo. A imagem é pura; o texto corrompe. A imagem, o ideal, o puro, nos dá sempre um horizonte; o texto nos puxa para baixo, explica, tenta nos deixar com os pés no chão.


Consequência dessa luta nostálgica entre texto e imagem ditada por Baudrillard é a inevitável distância irreparável que se alastra entre as diversas áreas do conhecimento, cada qual direcionada a sua própria função pragmatista, produzindo infinitos textos para as mesmas imagens. Trata-se de uma luta sem toque entre ideal e real que marca toda a história da filosofia ocidental. Mesmo que não tenhamos consciência suficiente disso, é inegável que o próprio fato de estarmos vivos nos coloca diariamente neste dilema entre imaginar e explicar. Portanto, creio que os problemas filosóficos referentes às questões do conhecimento, das suas condições e possibilidades, da sua certeza ou incerteza, da verdade ou do erro, também fazem parte do campo do Design.


Devemos levar em conta que o conhecimento humano enquanto conceito universal difere muito quando aplicado às singularidades nas quais efetivamente acontece, isto é, nas diversas maneiras pelas quais nós, seres humanos, nos relacionamos conosco mesmos e com o mundo no qual estamos inseridos. Somos seres finitos jogados nesta tarefa infinita do conhecimento, em situação constante de aprendizado e reflexão. Sendo assim, qualquer área de conhecimento não deve se restringir apenas à criação de conceitos, mas principalmente ao estudo crítico de outros conceitos já consolidados, modificando-os ou ampliando-os num movimento contínuo de retomada e deslocamento (FOUCAULT, 2000, p. 8). Não existe imagem sem a expectativa de um texto, assim como não existe texto sem a lembrança de uma imagem. Tal relação de interdependência antecede o próprio conhecimento, configurando a questão do sentido imagético de se conhecer.


Retomando a minha suspeita inicial, o problema se torna mais difícil no Design porque não é só uma questão de entender como se conhece, mas principalmente como se aplica. Sendo assim, defendo que é somente no exercício da reflexão crítica que ocorre o distanciamento e a reviravolta necessários para o crivo de um sentido significativo para aquilo que chamamos de Design. E o pensamento autocrítico se opõe à ideia de solução – objeto este que muitos veem como sendo a finalidade última do Design – pois a tarefa da reflexão filosófica não é solucionar nada, antes disso é problematizar, no sentido de instaurar um diálogo permanente em nosso próprio pensamento.


Portanto, embora tudo isso possa parecer pertinente à disciplina Teoria do Design, a proposta de uma possível e provisória Filosofia do Design consiste em analisar o Design como um objeto de estudo filosófico, distanciando-se do mesmo para tentar estabelecer algumas analogias inusitadas e construtivas. Mais do que isso, acredito que somente se reconhecermos o caráter subjetivo e indeterminado de nossa área, sobretudo em nosso potencial imagético, é que poderemos ampliar o nosso campo de atuação e o nosso campo teórico. Só assim perceberíamos como o nosso trabalho ressoa no dia-a-dia das pessoas em esferas que ultrapassam os muros do mercado e da própria academia.




Referências Utilizadas:


- ARISTÓTELES. Metafísica (Livros I e II). Tradução de Vinzenzo Cocco. In: Os pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1979, p. 11.


- BAUDRILLARD, J. Cool memories IV. São Paulo: Estação Liberdade, 2002.


- FOUCAULT, M. Arqueologia das ciências e história dos sistemas de pensamento. In: Coleção Ditos e Escritos, vol. II. Manual Barros da Motta (org). Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2000.


__________


Marcos Beccari é graduado em Bacharelado em Design Gráfico pela Universidade Federal do Paraná (UFPR) e aluno do programa de Mestrado em Design da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Tem experiência nas áreas de Comunicação Visual e Artes Visuais. Seu interesse de pesquisa atual é Filosofia do Design, Teoria do Design e Estudos do Imaginário. É nosso convidado e irá postar semanalmente no blog.
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4 Comentários
Iuri Sérgio escreveu:
“…mas principalmente ao estudo crítico de outros conceitos já consolidados, modificando-os ou ampliando-os num movimento contínuo de retomada e deslocamento (FOUCAULT, 2000, p. 8).”


Uma eterna desconstrução, maturação e construção do conhecimento.


Rafael Gatti escreveu:
Concordo que a abordagem filosófica na exploração do “caráter subjetivo e indeterminado de nossa área” seja bastante útil. Atualmente sentimos um grande movimento de relativização, ainda mais destes aspectos subjetivos. Citaria, como exemplo, a definição da beleza nos objetos: O que é o belo? (um tema sempre presente nas reuniões entre amigos onde o assunto é design). Será que relativizar a resposta (o que cada um achar que é!) tem alguma utilidade para um campo? Pergunto ao autor: “O que é o belo?” seria uma questão filosófica do design?


Marcos Beccari escreveu:
Deveras grato pelos comentários, amigos. Rafael, respondendo sua pergunta, creio que seria muito pretensioso dizer que a questão do belo pertence ao Design ou à Filosofia do Design. Trata-se de um questionamento metafísico e, por isso, pode ser respondido por qualquer postura epistemológica, especialmente pelo relativismo como você bem observou. Acho até saudável esse relativismo por ser uma resposta sempre segura e muito provável. Embora eu defenda que a estética está diretamente relacionada aos arquétipos do inconsciente ou aos chamados noûs poietikós de Aristóteles(adotando uma postura mais fenomenológica), não critico o relativismo (não há como criticar).


Porém, estética não deixa de ser uma questão pertinente àquilo que chamo de Filosofia do Design. O problema, ou a tal pretensão, se deve ao fato de não haver uma definição epistemológica segura e coerente ao Design, sendo portanto isso que nos cria um abismo com a estética, metafísica, ontologia, etc. Por isso geralmente recorremos ao relativismo, sem nem nos darmos conta disso, afinal, como eu disse, é um porto seguro para as questões metafísicas. Repito que não acho isso errado, mas pode se tornar dogmático na medida em que não conhecemos outros caminhos.


eduardo camillo escreveu:
Concordo com esse trecho final do seu comentário, Marcos, e acrescentaria, inclusive, que a tomada de uma postura relativista muitas vezes está associada à preguiça mental… rs. É que é mais fácil dizer que o belo é relativo do que tentar fundamentá-lo de alguma maneira, já que é um trabalho bastante árduo, e que irá encontrar opositores em grande quantidade. É, inclusive, fácil numa discussão saber se uma postura relativista é por facilidade ou por opção intelectual mesmo.
De fato, o belo é um questionamento muito maior do que a Filosofia do Design poderia responder. Mas é necessário que exista na “pauta” de assuntos desta, já que fundar uma epistemologia do design necessariamente seria averiguar a amplitude que a estética deve ocupar no projeto de design, que, para mim está claro, não é o mesmo que nas demais áreas do conhecimento/atuação…